A Cidade como objeto de estudo: conceções e correntes de pensamento sobre as cidades

Como é que a cidade se foi constituindo como objeto de estudo?

As cidades vêm assumindo um protagonismo cada vez maior, como objeto de estudo, nos quadros teóricos e empíricos das ciências sociais e, em particular, da sociologia.

Podemos, hoje, falar de cidades como atores sociais complexos e multidimensionais, assevera Jordi Borja (1997) sustentando a sua afirmação com o protagonismo crescente que, nos últimos anos, as cidades vêm adquirindo na vida política mas também económica, social, cultural e mediática. O autor atribui a fase inicial desse protagonismo à crise económica mundial dos anos 1970, que terá provocado uma reação pronta por parte dos governos locais, mas também dos principais atores económicos e sociais das cidades. Além de terem concentrado energias para atrair investimentos, gerar emprego e renovar as bases produtivas das cidades, os governos locais concertaram esforços com aqueles outros atores económicos e sociais para a promoção das cidades que passariam, então, a ser encaradas como forças motoras do desenvolvimento económico (Gomes, 2013).

Futurama. Fonte: http://futurama.wikia.com/wiki/New_New_York?file=New_New_York_Cityscape.jpg



Contudo, nem sempre foi assim. Na sociologia clássica, o tema da cidade nunca foi tratado pelos fundadores da sociologia: os franceses Auguste Comte e Émile Durkheim. Em contrapartida, foram os alemães – com uma perspetiva multidisciplinar (economia, direito, filosofia, política, literatura) – que descobriram a cidade como um tema central da sociologia: por ser um lugar central também na modernidade.
Max Weber, Werner Sombart, Karl Marx, Friedrich Engels e Georg Simmel estiveram na origem das primeiras escolas de sociologia urbana e influenciaram as pesquisas que se seguiram, no campo da sociologia em geral e da sociologia urbana em particular.

A excelência dos seus trabalho, que ainda hoje se mantém, consistiu:
  • Na capacidade de antecipação de fenómenos que, na sua época, ainda não eram facilmente percetíveis;
  • No distanciamento crítico em relação àquilo que viria a ser chamado de modernidade, cujos efeitos passaram a manifestar-se no espaço urbano.
A partir de meados do século XIX, estes autores analisaram as grandes transformações sociais decorrentes dos rápidos processos de industrialização e de urbanização – contexto das suas obras.

Todas as sociedades industriais modernas são fortemente urbanizadas. "A forma mais extrema da estrutura urbana atual é representada pelo que se designou como megalópolis, a «cidade das cidades». O termo foi cunhado na Grécia Antiga para designar a cidade-estado planeada para ser a inveja de todas as civilizações, mas o seu uso corrente tem pouca relação com esse sonho" (Giddens, 2000: 561).

Na visão síntese de Anthony Giddens (2000: 561 e 562):

     "Só na viragem para o século XX é que os estatísticos e observadores sociais começaram a estabelecer a distinção entre cidade e campo. Reconheceu-se que as cidades com muita população eram mais cosmopolitas do que os centros mais pequenos e que estendiam a sua influência para além da sociedade nacional a que pertenciam.
     A expansão das cidades é uma consequência do aumento da população, bem como da migração de pessoas das zonas rurais [...]. Esta migração tinha frequentemente um caráter internacional, com as pessoas das áreas rurais a mudarem-se para as cidades de outros países [...]. Desta forma, as cidades tornaram-se centros onde se concentrava o poder industrial e financeiro e, por vezes, os empresários criavam cidades novas a partir do nada. Chicago, que cresceu até  ter bem mais do que 2 milhões de habitantes em 1900, foi implantada numa região quase desabitada até aos anos 30 do século XIX."

A preocupação com a delimitação perfeita do número de habitantes para as cidades, bem como a amplitude da variação demográfica mais frutífera para a definição de uma cidade pequena ou média não é, todavia, nova. Era já visível no planeamento das cidades da Grécia Antiga, com os escritos de Platão e Aristóteles a indicarem limites mínimos e máximos para o bom funcionamento das cidades, da cidadania e do Estado (Gomes, 2013). Na verdade, esta preocupação deu origem, nos últimos séculos, a uma série de visões idealizadas para as cidades ou, nas palavras de Leonardo Benevolo, a “formas alternativas de fixação, descritas pelos utopistas” (Benevolo, 1995: 182)
 Novamente, na visão síntese de Anthony Giddens (2000: 561 e 562):

     "O desenvolvimento das cidades modernas teve um impacto enorme não apenas nos hábitos e formas do comportamento, como também nos padrões de pensamento e dos sentimentos. Desde o princípio dos grandes aglomerados urbanos, no século XVIII, tem-se verificado uma polarização das opiniões sobre os efeitos das cidades na vida social - o que ainda hoje sucede. Alguns encaravam as cidades como representantes da «virtude civilizada», a fonte de dinamismo e da criatividade cultural. Para estes autores, as cidades maximizavam as oportunidades de desenvolvimento cultural e económico e proporcionavam uma existência confortável e agradável. [...] Outros estigmatizaram a cidade como um inferno cheio de fumo e de multidões agressivas e desconfiadas, carregada de crimes, violência e corrupção."

Estas transformações estimularam, desde cedo, pensadores que se preocupavam com as questões da urbanidade e do urbanismo e deram corpo a várias escolas de pensamento sobre as cidades.

De seguida, serão exploradas as seguintes conceções e correntes de pensamento sobre as cidades.




         
 
 
          1. Os Utopistas
              Thomas More, Robert Owen, Charles Fourier, Jean Baptiste Godin,
              James Silk Buckingham, Benjamin W. Richardson, Ebenezer Howard
          2. O pensamento alemão
               1ª Geração: Max Weber e Werner Sombart
               2ª Geração: Georg Simmel e Walter Benjamin
          3. O pensamento em Inglaterra
              Desenvolvido por pensadores alemães em Inglaterra: Karl Marx e Friedrich Engels
          4. A Escola Americana - Chicago
              Robert Park, Ernest Burgess, Louis Wirth
          5. O pensamento francês
              Henri Lefebvre e Manuel Castells
          6. Escola America - Los Angeles
              Michael Dear



Do ponto de vista teórico, um problema partilhado, no pensamento contemporâneo, entre as cidades pequenas e médias reside na conceptualização das suas noções. Na verdade, parece tratar-se, aqui, de uma enfermidade comum não só a este tipo de cidades mas da ideia de cidade em si (Costa, 2002; Roques, 2009). Disciplinarmente, é a Geografia que mais metódica e continuadamente se vem ocupando do problema da definição das cidades pequenas e médias, centrando a análise sobretudo em critérios quantitativos cuja análise e categorização se tem traduzido, no entanto, em discussões nem sempre conclusivas e em sistematizações quase sempre inacabadas, ainda que se postule a necessidade de definição de uma escala teórica de análise distinta da metropolitana.

A preocupação com a delimitação perfeita do número de habitantes para as cidades, bem como a amplitude da variação demográfica mais frutífera para a definição de uma cidade pequena ou média não é, todavia, nova. Era já visível no planeamento das cidades da Grécia Antiga, com os escritos de Platão e Aristóteles a indicarem limites mínimos e máximos para o bom funcionamento das cidades, da cidadania e do Estado (Gomes, 2013).

Em A Política, Aristóteles defende que “é necessariamente muito bela uma cidade onde se encontre a justa medida de grandeza. […] Se uma cidade tiver poucos habitantes, pecará por penúria; se os tiver em excesso, poderá subsistir como nação, se contar com as coisas necessárias, mas já não será uma cidade” (Aristóteles, 1966: 126).

Explica Â. Endlich que, na visão destes dois filósofos, “o melhor critério para limitar a população de uma cidade é permitir [a] sua expansão somente até o ponto em que, assegurada a autossuficiência, seja possível abranger a cidade com o olhar” (Endlich, 2006: 409). Aqui está implícita, portanto, uma imagem de cidade que, para ser perfeita, nem deveria ser excessivamente grande nem demasiado pequena.

Depois de se referir às visões dos dois filósofos gregos, Endlich (2006: 410-411) traça a cronologia daquelas que, no seu entendimento, são as visões idealizadas para as cidades mais relevantes nos últimos séculos ou, nas palavras de Leonardo Benevolo, “as formas alternativas de fixação, descritas pelos utopistas” (Benevolo, 1995: 182):

Thomas More
A sua Utopia, publicada no séc. XVI, funcionaria como um reino imaginário através de uma sociedade justa e perfeita, “um mundo livre de ameaças imprevisíveis” (Bauman, 2007: 100).


http://artsandsciences.colorado.edu/ctp/2014/08/the-utopia-of-thomas-more/

Robert Owen
Projeto do início do séc. XIX para New Harmony, no estado de Indiana. De acordo com textos publicados por Kathleen M. Hogan (2011), na página eletrónica da Universidade de Virgínia, New Harmony representa uma das experiências de utopias menos bem-sucedidas nos Estados Unidos.


https://www.thinglink.com/scene/718211621108842497

Charles Fourier
Planos para o grande prédio falanstério, também do início do séc. XIX. Nas palavras de B. Freitag (2006: 52), o objetivo de Charles Fourier seria o de desestruturar a velha ordem social através dos falanstérios que na sua conceção seriam, simultaneamente, “organizações coesas, bem equipadas e organizadas para a vida e o trabalho coletivos, e construções confortáveis, que abrigariam até 2 mil pessoas”.  


https://teoriadoespacourbano.wordpress.com/2013/03/12/i-fourier-ou-as-passagens/

Jean Baptiste Godin
Inspirado por este modelo de cidade e comunidade do falanstério, Jean Baptiste Godin iniciou, em 1859, a construção do seu familistério, dotado de escola, teatro, lojas, piscina, bar e restaurante, para os mais de 600 operários que chegou a empregar e as suas respetivas famílias. O familistério sustentou-se por mais de 110 anos.

http://utopies.skynetblogs.be/archive/2008/11/23/jean-baptiste-godin-1819-1888-familistere-de-guise.html

James Silk Buckingham
Ainda em meados do séc. XIX, James Silk Buckingham desenhou o seu plano ideal de dez mil habitantes para a cidade inglesa de Victoria. Segundo o Vancouver Working Group Discussion Papers for the World Urban Forum (2005), os planos estritamente geométricos eram característicos de várias propostas elaboradas no séc. XIX que tinham como objetivo a correção de conflitos ou colapsos sociais através de ambientes urbanos bem construídos, cujo exemplo mais representativo é a cidade ideal de Victoria ensaiada por James Silk Buckingham. 

http://web.tiscali.it/icaria/urbanistica/buckingham/buckingham.htm

Benjamin W. Richardson
Concebeu a sua Hygeia, uma cidade para cem mil habitantes onde as condições higiénicas deveriam atingir a perfeição. Na visão de John W. Reps (s/d), o médico Benjamin Ward Richardson terá concedido, na obra Hygeia: A City of Health, datada de 1876, uma atenção mínima à dimensão estética do planeamento urbano, centrando a sua abordagem na definição das condições necessárias às infraestruturas e serviços urbanos capazes de maximizar o grau de saúde dos habitantes da cidade e, por essa via, aumentar a qualidade das suas vidas quotidianas.


By http://wellcomeimages.org/indexplus/obf_images/e4/40/637690204c3042ff2772d3c0ffdf.jpgGallery: http://wellcomeimages.org/indexplus/image/V0011612.html
 
A partir destas contribuições, e citando Lewis Mumford, Â. Endlich refere-se ao problema do ideal demográfico, que sempre constituiu uma preocupação para filósofos e cientistas com interesse nas cidades: “as propostas para cidades ideais quase sempre ficavam entre 25-30 mil habitantes”, refere Endlich (2006: 410), aludindo a uma última proposta, a das cidades-jardim, de Ebenezer Howard.

 
Ebenezer Howard
O modelo das cidades-jardim baseava-se num conjunto de localidades para cerca de trinta mil habitantes geometricamente dispostas em torno de uma cidade central. As cidades-jardim representavam, de facto, uma nova filosofia de cidade em que a ideia subjacente era a de que a sociedade humana e a beleza da natureza devem coexistir em estreita proximidade e harmonia (Howard, 1996; Horta, 2007).


http://www.vitruvius.com.br/revistas/read/arquitextos/12.144/4316
 

É, de resto, a busca incansável pela melhoria das condições de vida humanas o fator que Barbara Freitag (2006) identifica como denominador comum das várias utopias imaginadas ao longo dos séculos por filósofos, arquitetos, urbanistas e economistas. Nessas visões, os seus criadores estipulavam, mais do que limites mínimos, balizas máximas ao número de habitantes – valores que, idealmente, não dariam nunca origem a grandes cidades.

Contudo, a ideia de que estas visões constituem utopias urbanas é, ela própria, bastante discutível, na medida em que muitas delas previam a manutenção da escravatura, encaravam com naturalidade o trabalho infantil, planeavam exageradas jornadas de trabalho e pretendiam regular aspetos íntimos do quotidiano humano, como a idade do casamento e até mesmo a regularidade do contacto sexual entre os habitantes (Freitag, 2006).

 
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          1. Os Utopistas
              Thomas More, Robert Owen, Charles Fourier, Jean Baptiste Godin,
              James Silk Buckingham, Benjamin W. Richardson, Ebenezer Howard
          2. O pensamento alemão
               1ª Geração: Max Weber e Werner Sombart
               2ª Geração: Georg Simmel e Walter Benjamin
          3. O pensamento em Inglaterra
              Desenvolvido por pensadores alemães em Inglaterra: Karl Marx e Friedrich Engels
          4. A Escola Americana - Chicago
              Robert Park, Ernest Burgess, Louis Wirth
          5. O pensamento francês
              Henri Lefebvre e Manuel Castells
          6. Escola America - Los Angeles
              Michael Dear



1ª geração do pensamento alemão



Max Weber (1864-1929)

Weber nasceu em Erfurt, na Alemanha, em 1864 e morreu em Munique, em 1920. 

Nas Universidades de Göttingen e Heiderberg concentrou-se nos estudos de economia, história, filosofia e direito. Depois de um esgotamento nervoso, regressou ao trabalho em 1903, com Werner Sombart, como editor de uma importante revista, onde passou a publicar regularmente os seus trabalhos. 

Há quem defenda que algumas das ideias de Weber pertenciam, na verdade, a Werner Sombart, pensador que nunca foi tão conhecido como o primeiro. Sombart também escreveu sobre a cidade, enquanto centro de desenvolvimento do capitalismo.

Em "Economia e Sociedade" - uma das suas obras principais - e em "La cité", fala sobre a cidade: um conjunto caracterizado pelo tamanho, pela troca regular de bens e serviços e pela diversificação de funções. É, aliás, para as funções que Weber dirige a sua atenção nas cidades.

Weber desenvolveu uma famosa tipologia para as cidades ocidentais, descrevendo-as em vários momentos históricos, nos quais assumem diferentes funções que se vão acumulando ou alternando. Cada um dos tipos de cidade preenche, principal e maioritariamente, uma função: 
  • A cidade do príncipe – por aí se instalar o poder monárquico ou por ser a sede do governo (Versalhes, Brasília); 
  • A cidade do consumo – por ser uma cidade meramente consumidora, sem produção própria, como cidades onde há muitos reformados ou estudantes (cidades universitárias como Heidelberg); 
  • A cidade produtora – por ser uma cidade essencialmente industrial, produtora (como Manchester ou Chicago); 
  • A cidade comercial – por ser uma cidade de mercado, exportadora ou portuária (como Hamburgo ou Marselha). 
Empiricamente, há tipos mistos, que acumulam funções ou foram alternando essas funções do decorrer da sua evolução histórica, como as metrópoles modernas que tendem a ser, ao mesmo tempo, sede de governo e cidades consumidoras, por exemplo.

Weber não estudou propriamente as cidades, mas sim as suas funções. Ao conjunto de todas essas funções chamou “urbanismo pleno”.
 


Werner Sombart (1863-1941)

Sombart nasceu em Ermsleben, em 1863, e morreu em Berlim, em 1941.
Autor de "Amor, Luxo e Capitalismo", foi com esta obra que evidenciou a sua metodologia de pensamento, privilegiando os métodos qualitativos para analisar sinais exteriores de riqueza na sociedade. Sendo bastante criativo do ponto de vista metodológico, abordou o consumo como motor da sociedade industrial e urbana.

Werner Sombart foi uma figura controversa do pensamento social da chamada escola histórica alemã, associada à formação da sociologia compreensiva. A sua vasta obra está publicada em alemão e é de acesso difícil. A informação disponível em português é praticamente inexistente. Mais informações sobre Werner Sombart aqui.

Ao lado da produção destes autores, começou a desenvolver-se o pensamento histórico sobre as cidades, principalmente com Henri Pirenne e Fernand Braudel.

Nesta fase, a cidade era estudada por oposição ao campo, pelas suas diferenças em termos de configuração económica e política. Hoje, a produção científica sobre a cidade já não trabalha essa discussão sobre o campo. Ocorreu um processo de autonomização do objeto de estudo.




2ª geração do pensamento alemão

Trata-se de uma 2ª Geração da Escola Alemã, não pela distância temporal, mas pela forma de encarar a cidade. Georg Simmel e Walter Benjamin tratam a cidade por si só, e não a cidade como lugar de outros fenómenos sociais que estudam – como Weber ou Sombart que falam da cidade por ser o lugar do capitalismo.


Georg Simmel (1858-1918)

Simmel nasceu eu Berlim e morreu em Estrasburgo. Filho de judeus convertidos ao catolicismo, teve grandes dificuldades em afirmar-se no mundo académico da capital imperial alemã. 

Durante algumas décadas, viveu da herança da família, possuindo alguns títulos académicos não remunerados ou com baixa remuneração. Poucos anos antes de falecer (1914), recebeu uma oferta de trabalho bem remunerado na Universidade de Estrasburgo, mas o deflagrar da I Guerra Mundial viria a interferir na sua atividade docente.

Era um refinado ensaísta, cujos trabalhos faziam grande sucesso em França e nos EUA, onde era mais conhecido do que na Alemanha. Era conhecido com um expositor brilhante, como intelectualmente brilhante mas academicamente fraco. No final da sua vida, Weber intercedeu para lhe conseguir uma posição numa universidade alemã, mas Simmel não se adaptou ao lugar.

Apesar de ter escrito pouco sobre cidades, esse pouco marcou profundamente a sociologia urbana que se fez depois. Os ensaios mais importantes nesta área são:
  • “A metrópole e a vida do espírito”, 1903 – analisa a forma como a cidade transforma os indivíduos e as formas como estes se adaptam; 
  • “A sociologia do espaço”, 1903; 
  • “Porta e ponte”, 1909. 
O terreno privilegiado de Simmel era Berlim e, mais lateralmente, Viena.


Metodologia de Simmel: 

Faz um confronto da cidade mas não com o campo. Faz um confronto entre as grandes cidades e as pequenas cidades. 

O seu pensamento é sempre um misto de sociologia e psicologia. 

A sua abordagem sobre a cidade incide sobre as vivências dos seus habitantes, as suas representações mentais, códigos morais e modos de perceção que se desenvolvem nos contextos urbanos e que estão subjacentes à modernidade. 

Segundo ele, o que domina nestas novas cidades é uma lógica calculista da vida, uma lógica objetiva e racional. 

Simmel defendia que, nas grandes cidades, os indivíduos têm que se refugiar no seu individualismo, como forma de se protegerem das múltiplas relações possíveis e dos múltiplos estímulos que recebem. 

Sinteticamente, segundo Simmel, há 4 traços que caracterizam a vida nas metrópoles: 
  • Individualismo; 
  • Reserva mental – indiferença face aos outros; 
  • Espírito calculista; 
  • Atitude blasé – atitude de avaliação superficial, tratamento de tudo por igual. 

As suas ideias podem ser resumidas nos seguintes pontos: 
  • As cidades grandes criam as condições psicológicas para a intensificação e o aumento da vida nervosa e da vida mental dos indivíduos que as habitam. 
  • Essas cidades foram, desde os seus primórdios, a sede da economia monetária. 
  • As grandes cidades exigem aos indivíduos pontualidade, calculabilidade, exatidão, impessoalidade e anonimato. 
  • As grandes cidades são o lugar da atitude blasé, que se manifesta entre os habitantes da metrópole como uma distância pessoal, como um desinteresse por aquilo que os rodeia. 
  • O anonimato passa a ser uma vantagem na vida urbana, onde todos são estrangeiros entre si, o que permite aos indivíduos escapar ao controlo social das pequenas comunidades. 
  • As grandes cidades são lugares da mais elevada divisão económica e social do trabalho. Nelas, impõe-se a necessidade da especialização e da alta competência individual. 
  • As cidades são formações históricas próprias, cada uma com a sua individualidade – representam a cultura específica do seu tempo.


Walter Benjamin (1892-1940)

Nasceu em Berlim e morreu na fronteira franco-espanhola. Filho de judeus ricos, teve uma infância protegida. Confessava que só conhecia Berlim Oriental pela literatura. Estudou línguas clássicas, filosofia e teoria literária. 

Na década de 1920 tentou defender uma tese de pós-doutoramento em Frankfurt, cuja universidade era considerada especialmente liberal e tolerante com os descendentes de judeus abastados. No entanto, o seu estudo foi rejeitado pelo júri. Com a eleição de Hitler e a emergência do anti-semitismo do regime nazi alemão, Benjamin desistiu de voltar a Berlim, onde correria o risco de prisão ou deportação. Acabou por ficar em Paris, a cidade que elegeu como “a capital do século XIX”. 

Em 1940, Benjamin foi preso pelos franceses, correndo o risco de ser enviado para Auschwitz. A solução veio de Max Horkheimer (também sociólogo alemão) que financiou a sua libertação e um bilhete de Lisboa para a América do Norte. A caminho de Paris para Lisboa, Benjamin foi detido na fronteira espanhola e, em pânico com a ideia de Auschwitz acabou por suicidar-se.

Benjamin já não escreve numa fase de transição do pré-moderno para o moderno mas sim de cidade moderna consolidada.

Não pode ser considerado como um “sociólogo urbano” em sentido restrito. Foi antes alguém que deambulava pelas ruas de Paris, consagrando o conceito de flâneur, já cunhado antes por Baudelaire.

Como um pensador da cidade e como um flâneur, foi a sua obra publicada postumamente que teve maior divulgação – As Passagens de Paris.  Nesta obra, Benjamin centra-se nas armações de ferro da torre Eiffel, das estações de comboio, das passagens de pedestres – em suma, das galerias que interligavam as ruas de Paris. Para ele, essas galerias eram o elemento essencial do mundo da mercadoria, do capitalismo. Nessas galerias, nas montras, os bens e as mercadorias eram expostos, oferecidos ao olhar do consumidor. 

É nas galerias que Benjamin vê deambularem as personagens alegóricas definidas por ele para a cidade, tipos-ideais – a prostituta, o catador de papéis, o jogador, o flâneur.

 
SÍNTESE

Cada um destes pensadores tem a sua forma própria de encarar a cidade. Mas, juntos, confirmam a ideia de uma escola: pela reciprocidade do pensamento e pela intertextualidade praticada – integram uma mesma escola de pensamento. 

Todos conseguiram filiar-se num grupo de estudos que reúne discípulos – que se encantaram com os seus trabalhos, influenciando depois outros pensadores dentro e fora da Alemanha. O caso mais famoso, influenciado por estes pensadores alemães, é o da Escola de Chicago, nos EUA. 

É difícil saber se foi Weber que influenciou Simmel ou se foi Simmel que incentivou Weber a mergulhar no estudo das cidades. Sendo conterrâneos e contemporâneos, moradores de Berlim na mesma época, é difícil crer que não tenha havido partilha de ideias. Em todo o caso, importa realçar que os dois pensadores elegem a cidade como a sede do dinheiro, da economia monetária e da racionalidade económica. 

Benjamin assistiu a algumas aulas de Simmel, sendo certamente influenciado por ele. Simmel viria a influenciar também Robert Park, da Universidade de Chicago.

Entre a 1ª e a 2ª gerações da Escola Alemã, surgiu uma Escola Inglesa feita por pensadores não ingleses (que estavam em Inglaterra). No entanto, no que respeita à literatura sobre as cidades, esta escola inglesa foi ofuscada pela 2ª Geração da Escola Alemã, no seio da qual Simmel teve um papel preponderante. 
 
 






          1. Os Utopistas
              Thomas More, Robert Owen, Charles Fourier, Jean Baptiste Godin,
              James Silk Buckingham, Benjamin W. Richardson, Ebenezer Howard
          2. O pensamento alemão
               1ª Geração: Max Weber e Werner Sombart
               2ª Geração: Georg Simmel e Walter Benjamin
          3. O pensamento em Inglaterra
              Desenvolvido por pensadores alemães em Inglaterra: Karl Marx e Friedrich Engels
          4. A Escola Americana - Chicago
              Robert Park, Ernest Burgess, Louis Wirth
          5. O pensamento francês
              Henri Lefebvre e Manuel Castells
          6. Escola America - Los Angeles
              Michael Dear
 


Entre a 1ª e a 2ª gerações do pensamento alemão sobre as cidades, surgiu uma corrente desenvolvida por pensadores não ingleses (que estavam em Inglaterra). No entanto, no que respeita à literatura sobre as cidades, esta escola inglesa foi ofuscada pela 2ª Geração da Escola Alemã, no seio da qual Georg Simmel teve um papel preponderante.
 
 
Karl Marx (1818-1883)
Karl Heinrich Marx nasceu a 5 de maio de 1818, em Treves, na Prússia Renana e morreu em Londres em 1883. Foi filósofo, economista, sociólogo, jornalista e um revolucionário.
Terceiro dos nove filhos de uma família de classe média judaico-alemã, estudou Filosofia, História e Direito nas universidades de Bonn e de Berlim, depois de ter concluído os estudos liceais na cidade natal. Em Bonn, conheceu Jenny von Westhalen, de origem aristocrática, com quem viria a casar mais tarde.
Concluiu o seu doutoramento na Universidade de Iena, com uma tese sobre a Diferença entre a Filosofia da Natureza de Demócrito e a de Epicuro (1841). Obrigado a renunciar à carreira universitária, entra como redator para a Gazeta Renana de Colónia mas viria a ser despedido no ano seguinte (1943). Muda-se para Paris, já casado, onde conheceu Engels, seu inseparável companheiro até ao final da vida.
Contactou com a Liga dos Banidos, que reunia refugiados políticos alemães em Paris e que, mais tarde, viria a dar origem à Liga dos Comunistas, cujo manifesto escreveu com Engels (1848). Os seus escritos revolucionários deram origem a um pedido de expulsão do governo prussiano, levando Marx a refugiar-se em Bruxelas. É, depois, expulso da Bélgica e volta, primeiro a Paris e depois a Colónia. Levado a tribunal depois da fracassada revolução de 1848, é expulso, primeiro da Alemanha e depois de Paris, refugiando-se em Londres, onde viveria até morrer (Cruz, 2001).
As suas obras são, ainda hoje, referências importantes para a análise das sociedades capitalistas e das lutas das classes trabalhadoras. O expoente máximo do pensamento marxista sobre as cidades dá-se, no entanto, com Friedrich Engels.
 
 
 
Friedrich Engels (1820-1895)
Nasceu a 28 de novembro de 1820, em Barmen, na Renânia e morreu em Londres, no dia 5 de agosto de 1895. Era mais velho de nove filhos de um rico industrial têxtil e pietista protestante.
Desde cedo, revelou simpatia pelas ideias de Hegel, mesmo antes de, em 1841, ter contactado com o círculo de Bruno Bauer, em Berlim, onde foi fazer o serviço militar e de ter passado, em Colónia, pela Gazeta Renana.
Na juventude, fica impressionado com a miséria em que vivem os trabalhadores das fábricas da sua família. Fruto dessa indignação, Engels desenvolve um detalhado estudo sobre a situação da classe operária na Inglaterra.
Permaneceu ligado à firma de seu pai, em Manchester, até 1870, tendo ajudado muitos refugiados políticos alemães, entre os quais Marx, a quem fixou uma renda anual a partir de 1869.
Foi um teórico revolucionário alemão que, com Karl Marx, fundou o chamado socialismo científico ou marxismo. Foi coautor de diversas obras com Marx, sendo que a mais conhecida é o Manifesto do Partido Comunista. Também ajudou a publicar, após a morte de Marx, os dois últimos volumes de O Capital, principal obra de seu amigo e colaborador.
Nos últimos anos de vida, desenvolveu intensa atividade teórica e doutrinária, publicando obras de crítica e de divulgação (Cruz, 2001).
 

Para Marx e Engels, a cidade era o espaço onde as contradições do modo de produção capitalista assumiam uma relevância particular. Estes autores não estudavam propriamente a cidade, mas sim a cidade como o lugar, por excelência, onde determinados fenómenos sociais em que estavam interessados aconteciam. É por referência a esses fenómenos que a cidade era estudada. 
 
O seu interesse na questão urbana residia nas dinâmicas do modelo de produção capitalista e no modo como estas dinâmicas criam determinados padrões de urbanização. O sistema capitalista era entendido como um factor determinante na emergência de cidades como espaços de desigualdade, de exclusão e de segregação das camadas populacionais mais pobres e desfavorecidas, à mercê de uma burguesia dominante e poderosa.

Fizeram uma análise do fenómeno urbano centrada em duas dimensões fundamentais:

1. A cidade era entendida como a expressão da lógica capitalista – burgueses e operários, construção de bairros operários e de toda uma nova cidade que não era necessária antes do capitalismo;

2. O processo de urbanização é interpretado como uma condição necessária para a construção do socialismo – só na cidade se poderia dar a revolução socialista; em Marx e Engels os camponeses não desempenhavam um papel importante. 

Karl Marx

"O capital" (1867 - primeiro volume).
Nesta que é considerada a sua obra mais importante, Marx denuncia a exploração da classe operária nos centros urbanos da Europa no século XIX, que viria a prolongar-se para o séc. XX.

 
Friedrich Engels

A sua obra sobre as condições de vida da população operária em Machester, "A Situação da Classe Trabalhadora na Inglaterra" (1845), é considerada uma das mais importantes do seu trabalho.
Nessa obra, defende que a cidade não tem condições para acolher os trabalhadores que a procuram, facto que dá lugar a configurações espaciais diferentes das que até então eram conhecidas. Defende, também, que o crescimento das cidades origina o correlativo crescimento das desigualdades.
As mudanças no desenho das cidades permitiam que fosse possível viajar dos subúrbios até ao centro de Manchester sem ver nenhum dos bairros pobres entretanto construídos. Engels defendia que se tratava do funcionamento da arquitetura ao serviço das classes mais favorecidas.


SÍNTESE


Para estes pensadores, a cidade ocidental moderna era o lugar da produção e da reprodução do capital, resultante da sociedade capitalista sendo, portanto, constitutiva de processos sociais mais amplos. A cidade era a expressão visível da degradação da classe operária e das suas condições de vida, denunciadas em "A situação da classe trabalhadora na Inglaterra" (Engels, 1845) e em "O Capital" (Marx, 1867).
No "Manifesto do Partido Comunista" defenderam que "a história de qualquer sociedade até nossos dias é a história da luta de classes" (Marx e Engels, 1848), daí resultando a noção de cidade industrial do séc. XIX, como lugar da histórica lutas de classes. Berço da burguesia e da sua ascensão revolucionária, a cidade era, também, o espaço onde se evidenciava a exploração dos trabalhadores e onde tal exploração seria superada, através da revolução operária.
 
Outras obras de Karl Marx e Friedrich Engels disponíveis aqui.






          1. Os Utopistas
              Thomas More, Robert Owen, Charles Fourier, Jean Baptiste Godin,
              James Silk Buckingham, Benjamin W. Richardson, Ebenezer Howard
          2. O pensamento alemão
               1ª Geração: Max Weber e Werner Sombart
               2ª Geração: Georg Simmel e Walter Benjamin
          3. O pensamento em Inglaterra
              Desenvolvido por pensadores alemães em Inglaterra: Karl Marx e Friedrich Engels
          4. A Escola Americana - Chicago
              Robert Park, Ernest Burgess, Louis Wirth
          5. O pensamento francês
              Henri Lefebvre e Manuel Castells
          6. Escola America - Los Angeles
              Michael Dear
  

Migração do pensamento urbano da Europa para os EUA – 2 condições essenciais:
  • Crescimento exacerbado das cidades americanas, que criava as condições para o desenvolvimento teórico;
  • Época de guerra mundial – a Europa entrou em guerra, de 1914 a 1918, o que diminui as condições para a produção científica.
Chicago – 1ª corrente de pensamento urbano nos EUA, nos anos 1920. Debatia-se com o problema da definição de cidade. Como se define uma cidade? É por oposição ao campo? Ou por oposição a pequenas localidades?


Robert Park (1864-1944)
Robert Ezra Park foi um sociólogo norte-americano e um dos mais eminentes pensadores da Escola de Chicago. Era também jornalista e geógrafo. 
Depois de lecionar algumas disciplinas na Universidade de Chicago, sobre os acontecimentos na cidade, passou algum tempo na Europa, onde assistiu a aulas de Georg Simmel. Ao voltar aos EUA, dedicou-se aos estudos urbanos e à organização de um curso que viria a ser conhecido como Escola de Chicago.
Além de Simmel, Robert Park foi muito influenciado por Ebenezer Howard (1850-1928) e pelo seu modelo das cidades-jardim. Assim, passou a defender que o fenómeno urbano deveria ser abordado com base numa ecologia humana.
 
 

Diagrama N2 - Cidade-Jardim
O esquema mostra a distribuição geral da Cidade-Jardim, concebida por Ebenezer Howard (1996 - 1a edição 1898). A cidade deveria ter uma estrutura radial, com 6 grandes avenidas em direção ao centro. Mostra os primórdios da divisão de usos e da adoção de baixas densidades. Fonte: HOWARD, Ebenezer. Cidades-Jardins de amanhã. São Paulo: Hucitec, 1996. http://urbanidades.arq.br/bancodeimagens/displayimage.php?album=5&pos=2

As “cidades-jardim” são concebidas como cidades planeadas, com comunidades equilibradas de residentes, rodeadas de cinturas verdes e albergando áreas habitacionais, de indústria e agricultura devidamente articuladas. A cidade-jardim representa uma nova filosofia de cidade. A ideia subjacente era a de que a sociedade humana e a beleza da natureza devem coexistir em proximidade.
A tese de Howard enuncia o efeito de magnetismo dos centros urbanos sobre as populações (da “cidade” e do “campo”), convergindo num mix que é a própria “cidade-jardim”.
 



Ebenezer Howard - Os três magnetes
Mostra as três "forças" de atração da população: o campo, a cidade, e a cidade-jardim, que seria capaz de conjugar as vantagens dos dois primeiros, sem suas desvantagens.  Traduzida e redesenhada por Fernanda Tomiello (2009) http://urbanidades.arq.br/bancodeimagens/displayimage.php?album=5&pos=17

Para Robert Park, as cidades podiam ser vistas como organismos vivos, como plantas que crescem e se expandem, definham e morrem. Segundo Park “Sabemos que as comunidades urbanas nascem, se desenvolvem, se espraiam por algum tempo, até se encolherem novamente. As sociedades humanas são como comunidades botânicas”.
A Escola de Chicago foi também uma escola de ecologia urbana, uma vez que, ao aplicarem os princípios teóricos da ecologia vegetal e animal às comunidades humanas, os seus pensadores procuraram explicar o uso seletivo que os grupos humanos fazem do espaço urbano:
"Em similitude com as sociedades humanas, os sociólogos norte-americanos Park e Burgess usaram pela primeira vez, em 1921, a expressão "ecologia humana", justamente com o sentido de explicarem os comportamentos dos grupos humanos de acordo com idênticos comportamentos dos animais e vegetais em relação ao ambiente em que se inscrevem. Foi Park quem instituiu a teoria da relação causal entre distância social e distância física: o que está em causa é fundamentalmente, neste período, a existência de uma sociologia do espaço a partir da qual as diferenças sociais entre grupos podem ser "medidas" (1974, Duchac - La sociologie des migrations aux États-Unis. Paris: Mauton). Segundo esta teoria, os grupos diferenciados ocupam as parcelas do espaço - numa ordem de importância étnica, social e económica - em processo conflituoso, de acordo com a capacidade que uns têm para se sobrepor aos demais, levando tal circunstância ao domínio de uns sobre outros ou, em alternativa, à assimilação progressiva dos mais fracos pelos mais fortes." (Porto Editora, 2003-2016)
 
 


Ernest Burgess
Ernest Watson Burgess (16 de maio, 1886 - 27 de dezembro, 1966 ) foi um sociólogo urbano canadiano nascido em Tilbury, Ontario. Estudou na Kingfisher College, em Oklahoma e continuou os seus estudos de pós-graduação em sociologia na Universidade de Chicago. Em 1916, regressou à Universidade de Chicago, como docente . Burgess foi também o 24º presidente da Associação Americana de Sociologia ( ASA).
Apresentava a cidade como um conjunto de anéis concêntricos. Ao contrário da cidade medieval e barroca (que crescia de fora para dentro), a cidade apresentada pela Escola de Chicago crescia de dentro para fora. A solução para o crescimento das cidades passou pela saída das classes médias do centro para os subúrbios.
 

 
 
 
Ernest Burgess usou um mapa para descrever a organização sócio-espacial de Chicago. A linha compacta de norte a sul marca a linha costeira, com Chicago à esquerda e o Lago Michigan à direita. Os vários anéis concêntricos dividem a cidade em zonas concêntricas. 
Para Burgess, estas zonas concêntricas eram características comuns a todas as cidades e não apenas visíveis em Chicago.
Cada zona tinha um caráter específico:
 


Com base nos fundamentos da ecologia humana – em particular na teoria e competição pelo espaço – Burgess explica a distribuição espacial de residências, bairros, indústria e comércio.
  • A competição pelo espaço gera determinados espaços diferenciados e determinada organização social nesses espaços – representados pelas zonas concêntricas;
  • O centro da cidade, caracterizado pela abundância de atividades sociais, culturais e económicas, é dominado por aqueles que dispõem de recursos suficientes para poderem lá viver.
  • Os outros indivíduos, com menos recursos, fixam-se em áreas circulares perto do centro da cidade.
  • Burgess tenta ainda mostrar como as características da organização da população urbana estão inscritas no espaço – crime, delinquência, violência e conflitos entre gangs, tensões raciais e outros problemas sociais foram identificados em áreas urbanas degradadas, por exemplo, na área em transição (Zona II).
    http://citywiki.ugr.es/wiki/Urban%C3%ADstica_1_grupo_A_curso_08/09/MARIAGARC%C3%8DABARRERA/Mirar/Chicago_Burgess
Apesar do caráter inovador do modelo de zonas concêntricas, este não deixou de ser alvo de críticas:
  • O modelo constituía uma representação tipo da cidade moderna. Contudo, estudos desenvolvidos na área viriam a questionar a sua dimensão universal, assim como a sua aplicabilidade a qualquer cidade dos EUA. Muitos autores defendiam que a cidade industrial, ao contrário do proposto por Burgess, era constituída por vários centros.
  • Crítica ao aspecto biológico (sobrevivência dos mais aptos) como um factor determinante na teoria ecológica da cidade, que tende a relegar para segundo plano as questões culturais e sociais.

 
Louis Wirth (1897-1952)
Louis Wirth (Gemünden, 28 de agosto de 1897 - Buffalo, 3 de maio de 1952) foi um sociólogo alemão, membro proeminente da Escola de Chicago.
Louis Wirth propôs uma abordagem diferente sobre as questões urbanas. Questão fundamental: saber o que existe de específico na cidade que produz aquilo a que se poderia chamar de estilo de vida urbano. 
Foi influenciado pelo trabalho de Simmel, mas viria a afastar-se deste. Enquanto Simmel pretendia entender a vida urbana à luz das forças sistémicas do capitalistmo e, em particular, da economia monetária, Wirth centrou-se no estudo das características das pessoas que viviam na cidade e no modo como as vivências na cidade produziam uma cultura distinta – a cultura urbana.
O urbanismo, ou o estilo de vida urbano, é concebido como um “complexo de traços que configuram o modo de vida típico das cidades”. Ao interpretar a vida social urbana, Wirth desenvolve uma teorização pioneira e sistemática da cidade.
Hipótese central: as mudanças nos modos de vida urbana deviam-se a três fatores principais:
 
1. Dimensão agregado populacional: 
  • Só faz sentido chamar cidade a um conjunto urbano a partir de uma dada dimensão/ escala;
  • Provoca a diversificação e a individualização;
  • Aumenta a competição entre indivíduos;
  • Anonimato, superficialidade e utilitarismo nas relações interpessoais.
2. Densidade: 
  • Não basta que a cidade seja extensa, tem de ter densidade de relação. Uma teia de interações intensas entre sujeitos diferentes entre si. 
  • A densidade intensifica os efeitos da dimensão do agregado populacional;
  • Intensificação da atitude blasé;
  • Maior capacidade para viver com desconhecidos.
3. Heterogeneidade: 
  • A cidade alberga a diferença; traz o «nós» em relação aos «outros»;
  • Quanto maior a heterogeneidade, maior a tolerância entre grupos;
  • Intensificação do anonimato.
Regresso ao princípio: esta definição da cidade é feita por oposição ao campo. Campo como dimensão relacional da cidade. Na urbanização americana ainda fazia sentido a discussão sobre o campo: a América ainda se estava a industrializar. Nunca tinha sido feita uma definição como esta do que era uma cidade.
Os efeitos deste conjunto de fatores poderiam ser analisados estatisticamente, conferindo à teoria de Wirth a capacidade de previsão de determinados resultados. Por exemplo, numa amostra de cidades, quanto mais altos fossem os valores obtidos nos três fatores, maior seria a possibilidade de estarmos perante uma verdadeira cultura urbana.

No seu texto "O urbanismo como modo de vida", publicado originalmente em 1938, Louis Wirth discutia o grau de influência das cidades no mundo seu contemporâneo e argumentava que aquelas não eram somente o lugar de habitação e trabalho dos indivíduos modernos mas “o centro que põe em marcha e controla a vida económica, políica e cultural”. Por essa razão, concluía, há mais de seis décadas, que o “crescimento das cidades e a urbanização do mundo são dos fenómenos mais impressionantes dos tempos modernos” (Wirth, 2001 [1938]: 45).
Tal como Simmel, Wirth não se apresentava otimista relativamente à vida na cidade. Esta era caracterizada pela erosão das relações primárias – as quais tendiam a ser substituídas por relações secundárias, utilitárias e impessoais.
 
SÍNTESE - Alguns contributos fundamentais da Escola de Chicago:

1. Os trabalhos desenvolvidos por estes sociólogos articularam, pela primeira vez, de forma explícita, os padrões da organização social com a dimensão espacial – o espaço socialmente construído.
2. As pesquisas baseavam-se na observação direta de interações sociais, a partir das quais se pretendia identificar as novas formas de organização social.
3. As preocupações com o modo como a vida urbana conduzia à desorganização social e a novas patologias individuais foram responsáveis pela investigação exaustiva de comunidades marginalizadas, assim como dos padrões de adaptação exibidos por indivíduos, grupos e comunidades ao espaço urbano.
4. Envolvimento direto dos seus membros no planeamento e nas políticas urbanas. Estes acreditavam em ideais democráticos e na necessidade de reformas sociais que tornassem possível a melhoria das condições de vida urbana – evitando a desagregação social característica da cidade de Chicago, em particular, e das grandes metrópoles em geral.
 
Para os membros da Escola de Chicago, a cidade moderna era concebida como um lugar de desorganização social, de conflito e de constante luta pela sobrevivência. Esta conceção da cidade viria a influenciar, de forma determinante, as investigações desenvolvidas no âmbito da sociologia urbana.
 






          1. Os Utopistas
              Thomas More, Robert Owen, Charles Fourier, Jean Baptiste Godin,
              James Silk Buckingham, Benjamin W. Richardson, Ebenezer Howard
          2. O pensamento alemão
               1ª Geração: Max Weber e Werner Sombart
               2ª Geração: Georg Simmel e Walter Benjamin
          3. O pensamento em Inglaterra
              Desenvolvido por pensadores alemães em Inglaterra: Karl Marx e Friedrich Engels
          4. A Escola Americana - Chicago
              Robert Park, Ernest Burgess, Louis Wirth
          5. O pensamento francês
              Henri Lefebvre e Manuel Castells
          6. Escola America - Los Angeles
              Michael Dear
 



Nos anos 1960, o pensamento urbano regressa à Europa, sobretudo a França. Aqui, a referência é Paris e, lateralmente, Londres. O problema fundamental que inquieta estes pensadores é o do Maio de 68 e a anomia que daí pode resultar.
Henri Lefebvre e Manuel Castells são as referências principais desta escola francesa que se ocupa dos direitos de acesso à cidade e aos seus serviços.
  
Henri Lefebvre (1901-1991)
Lefebvre estudou filosofia em Paris e entrou num grupo de estudo sobre Marx, dedicando-se à tradução e interpretação dos seus trabalhos.
Na década de 1970, passou a fazer uma sociologia do espaço urbano de matriz marxista. Contexto: finais dos anos 1960, Maio de 68, agitação social que ocorria, essencialmente, em meio urbano.
Abordou a questão urbana com base numa reflexão sobre a ocupação do espaço: estudou a expansão urbana da sociedade pós-industrial capitalista; fez um balanço negativo dessa urbanização; e ressaltou a incapacidade das autoridades públicas manterem a ordem nos grandes centros urbanos.
 
 
Por influência de Marx e Engels, Lefebvre defendia que categorias económicas tais como capital, força de trabalho, lucro, rendas, salários e exploração eram noções que se aplicam ao estudo das cidades, na medida em que via o desenvolvimento urbano como um produto do sistema capitalista, tal como qualquer outra mercadoria.
Ao analisar os padrões de desenvolvimento da cidade, sustentava que a atividade imobiliária, por exemplo, desempenha um papel fundamental no declínio, rejuvenescimento ou reabilitação de determinadas áreas da cidade:
→ Os padrões de crescimento da cidade não podem ser dissociados do capital.
→ O espaço está subordinado à lógica do capitalismo.
 
Lefebvre defendia que a Escola de Chicago teorizava pouco: descrevia mas não se preocupava com a teorização. Numa das suas obras mais importantes, "La production de l’éspace" (1974), pretendia desenvolver uma “teoria unitária do espaço”. Defendia que há vários espaços e que esses espaços estão articulados entre si:
- O espaço físico (meio físico envolvente); 
- O espaço mental (representações sobre o espaço); 
- O espaço social (práticas sociais no espaço).
 
Lefebvre sustenta que as teorias urbanas e as políticas de planeamento urbano devem ser entendidas como formas ideológicas. Por isso, devem ser questionadas e desconstruídas, através de perspetivas capazes de explicar o espaço como uma construção da lógica capitalista. O espaço não é um simples recetáculo social; é o resultado de uma tríade espacial.
 
Três categorias essenciais de Lefebvre:
  • Práticas espaciais: são as práticas sociais que têm lugar no espaço. Trata-se de práticas que estruturam a realidade do dia-a-dia e que estão relacionadas com formas de percepção do mundo, do espaço vivido e concebido.
  • Representação do espaço: é o espaço pensado, concebido, representado; a sua forma mais elementar é um mapa. Mas é também o espaço representado em teorias produzidas por profissionais, técnicos, urbanistas, arquitectos, engenheiros, etc. Estas representações inscrevem-se em relações de poder.
  • Espaço de representação: trata-se de uma representação simbólica do espaço; as formas como o espaço é cultural e simbolicamente pensado. É o espaço que se constitui a partir de um conjunto de imagens e símbolos que se articulam com a experiência do espaço físico e geográfico.
Segundo Lefebvre, “o espaço é uma construção social”. “O espaço é socialmente construído”. O espaço é a sociedade; não são duas entidades separadas em que uma (sociedade) determina e a outra (espaço) é determinado.
 
Para além desta linha teórica, sobre a constituição e as especificidades do espaço, Lefebvre desenvolveu outra, a do direito à cidade, nomeadamente o direito de residir na cidade e de usar a cidade. A ideia do direito à cidade surge contra a exclusão social. Trata-se de uma linha mais política do que a anterior, que é mais sociológica.
 
Lefebvre defendia que o habitante urbano deveria ter direito à cidadania, como complemento do direito à diferença e do direito de acesso democrático à informação. Referia-se aos direitos à educação, ao trabalho, à cultura, ao descanso, à saúde e à habitação.
 
Lefebvre influenciou vários pensadores, entre eles: David Harvey, geógrafo britânico e Manuel Castells, geógrafo espanhol, que desenvolveu trabalho em Paris.
 

 
Manuel Castells (1942-)
Nasceu em Espanha e foi militante nos movimentos urbanos contra a ditadura de Franco. Foi perseguido pelo seu ativismo político e foi obrigado a procurar refúgio político em França.
A sua atuação política durante o Maio de 68 valeu-lhe a expulsão de França. Emigrou, depois, para os EUA.
O seu primeiro livro importante foi "La Cuéstion Urbana" (1972), um livro claramente marxista. 
Esta obra constitui uma das críticas mais devastadoras às teorias urbanas desenvolvidas até à década de 1970. Por outro lado, oferece novas perspetivas de análise e de reflexão sociológica sobre a cidade capitalista contemporânea. 
A crítica principal de Castells residia na ideia de que a sociologia urbana, enquanto disciplina científica, não possuía um objeto teórico específico. Dirigia as suas críticas para a falta de fundamentação teórica que, a seu ver, caracteriza as perspetivas culturalistas de Louis Wirth ou as abordagens evolutivas do desenvolvimento urbano de Robert Park.
 
"O que caracteriza a sociologia urbana é exatamente a ausência de delimitação precisa do seu objetivo real. Efetivamente, quando se fala de indústria designa-se um certo tipo de atividade produtiva, quando se fala de educação quer-se fazer referência a um conjunto de processos de aprendizagem, socialização e seleção institucionalmente estabelecidas, etc. Mas, o que é o urbano? […] Com efeito, se se estudam, sob a mesma etiqueta as “classes sociais urbanas”, a burocracia “urbana”, a política “urbana”, os tempos livres, as relações de amizade, os transportes e os seus problemas, etc., é porque se considera que todos estes fragmentos da vida social são próprios de um novo tipo de sociedade, de uma espécie de “nova forma de vida” urbana […]. Nesse caso, a sociologia urbana seria, nem mais nem menos, a sociologia da sociedade “moderna”, da sociedade de massas." (Castells, 1972)
 
A par desta crítica, Castells tenta reformular o campo teórico e empírico da sociologia urbana. Uma mais-valia deste livro é o trabalho de definição de vários conceitos: Cidade; Urbanização; Urbanização selvagem; Formas espaciais; Espaço.
 
As ideias centrais de La Cuéstion Urbana podem resumir-se nos seguintes pontos:
  1. As problemáticas urbanas são centrais nas nossas sociedades.
  2. Essas problemáticas foram tratadas de forma ideológica nas ciências sociais, mas há que reconhecer os problemas concretos na cidade e procurar categorias adequadas para analisá-los.
  3. O marxismo não forneceu essas categorias.
  4. O papel central do Estado, no actual processo de urbanização, exige uma teoria capaz de integrar a análise do espaço com as lutas sociais e os processos políticos. Por isso a referência ao marxismo é essencial, não como conclusão mas como ponto de partida.
Na sua reformulação teórica, Castells propõe um novo objeto teórico – o processo coletivo de consumo, para se referir ao facto de a cidade ser, para si, um lugar de consumo mais do que um local de produção, como era na época industrial.

 
Atualmente, Castells é o autor da cidade informacional, da cidade das tecnologias.
A revolução tecnológica centrada nas tecnologias da informação, a economia global e os movimentos sociais e culturais são, segundo Castells, as características dominantes de uma nova sociedade – a Era da Informação. A Era da Informação está a introduzir uma nova forma urbana, a cidade informacional.
A cidade informacional desenvolve-se em torno de fluxos – de capital, de informação, de tecnologia, de imagens ou de símbolos. Nesse sentido, introduziu a noção de espaços de fluxos.
Espaços de fluxos são vias comuns de comunicação que permitem a simultaneidade de comunicações em espaços geograficamente afastados. Na era da globalização, estes espaços permitem que as cidades se liguem em redes, numa conjugação de interesses. As cidades já não existem isoladas.

 
Castells descreve o espaço de fluxos em termos de três vetores principais:
  1. O circuito de impulsos eletrónicos (telecomunicações, processamento de computadores, sistema de telecomunicações e transporte em alta velocidade, com base em tecnologias de informação);
  2. Centros de importantes funções estratégicas e centros de comunicação. Há lugares mais importantes do que outros. “O espaço de fluxos não é desprovido de lugar, embora a sua estrutura lógica o seja. Está localizado numa rede eletrónica, mas essa rede liga lugares específicos com características sociais, culturais, físicas e funcionais bem definidas. […] Os centros de comunicação seguem uma hierarquia organizacional de acordo com o seu peso relativo na rede. Mas essa hierarquia pode mudar conforme a evolução das atividades processadas através da rede. Em alguns casos, certos locais podem ser desligados da rede o que resulta num declínio imediato e, portanto, em deterioração económica, social e física” (Castells, A Era da Informação).
  3. Organização espacial das elites administrativas. Estas elites exercem funções diretivas em torno das quais o espaço é articulado. Onde estão as elites? “A elite empresarial tecnocrata e financeira que ocupa posições de liderança nas nossas sociedades, também terá exigências espaciais específicas, relativas ao suporte material/ espacial dos seus interesses e práticas.”

Nesta nova sociologia urbana, os processos de globalização e de reestruturação económica constituem o pano de fundo para análise de novos processos de urbanização e de novas culturas urbanas. Se antes o pano de fundo era a Revolução Industrial, os processos de urbanização e o capitalismo, agora é a globalização e a reestruturação económica:
Modernidade →→→ Pós-modernidade

Este momento de retorno da sociologia urbana à Europa é crucial. Foi a partir daqui que os temas da sociologia urbana se expandiram e multiplicaram.
 
 
 
 
 
 
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          1. Os Utopistas
              Thomas More, Robert Owen, Charles Fourier, Jean Baptiste Godin,
              James Silk Buckingham, Benjamin W. Richardson, Ebenezer Howard
          2. O pensamento alemão
               1ª Geração: Max Weber e Werner Sombart
               2ª Geração: Georg Simmel e Walter Benjamin
          3. O pensamento em Inglaterra
              Desenvolvido por pensadores alemães em Inglaterra: Karl Marx e Friedrich Engels
          4. A Escola Americana - Chicago
              Robert Park, Ernest Burgess, Louis Wirth
          5. O pensamento francês
              Henri Lefebvre e Manuel Castells
          6. Escola America - Los Angeles
              Michael Dear



Nos anos 1980, surge uma nova corrente de pensamento sobre as cidades, nos EUA, agora em Los Angeles. Trata-se de um movimento académico centrado no urbanismo, que se desenvolveu na Universidade da Califórnia e da Universidade da Califórnia do Sul.
Não possuindo uma doutrina oficial associada e sendo caracterizada por uma grande diversidade nos trabalhos dos seus autores - como Michael Dear, Mike Davis, Allen J Scott, Edward Soja, Michael Storper e Jennifer Wolch - há um tema relativamente comum nas suas obras: a ideia de que Los Angeles é um caso paradigmático, uma metrópole especial e, por isso, não pode ser explicada pelos modelos teóricos construídos através do estudo de outras cidades americanas e europeias. Nesse sentido, Los Angeles precisaria de ser teorizada por si só.
 
Até muito recentemente, os debates sobre a estrutura urbana eram dominadas pelos pressupostos da Escola de Chicago, que incluem a ideia de que a cidade é um sistema regional coerente onde o centro organiza o seu interior. O surgimento da Escola de Los Angeles inverte essa lógica, insistindo que, nas cidades contemporâneas, são as áreas mais remotas que organizam o que resta dos centros. 
Assim, a Escola de LA representa um desafio para o que muitos dos seus membros entendem como a dominante Escola de Chicago. Enquanto esta última apresenta uma teoria modernista de cidades baseada em pressupostos como o darwinismo social e luta pelo espaço urbano, a Escola de Los Angeles Escola propõe uma visão pós-moderna ou pós fordista de cidade.
Embora nem todos os seus membros se identifiquem com os conceitos pós-modernistas, esse foco é fundamental para muitos, que seguem os teóricos associados ao pós-modernismo, como Baudrillard, Foucault, Jameson, e Derrida. 
Um outro fluxo de trabalho emergente da Escola de LA é representada por Scott e Storper, ambos com um vasto trabalho sobre a especialização flexível e as dinâmicas económicas da metrópole contemporânea. Abordando a teoria urbana a partir da perspetiva do pós-fordismo, em vez de pós-modernismo, o trabalho de Scott e Storper difere da visão de Dear e Soja.
 
Pressupostos gerais desta Escola:
  1. O que se faz em LA é urbanismo pós-moderno, ou novo urbanismo – é uma cidade sem fronteiras;
  2. Ideia de rede – todos os lugares estão ligados em rede; conectividade – intensos contactos das periferias com os centros;
  3. LA é uma cidade que não passou por fases de crescimento, nasceu assim, com a diversidade que a caracteriza.
  4. Los Angeles é a expressão de uma forma pós-moderna de cidade.

Principais críticas à Escola de Los Angeles:
  1. Várias críticas têm sido levantadas em reação à Escola Los Angeles. Talvez a mais importante consista num relativo ceticismo sobre a real importância desta Escola relativamente às suas reivindicações. Por exemplo, alguns autores defendem que a sua literatura exclui, por vezes, de forma propositada, discussões ou citações de outras obras importantes sobre as questões urbanas, para dar a impressão de que a Escola de LA é mais original e importante do que efetivamente é. Em particular, alguns críticos consideram que a importância contemporânea da Escola de Chicago é exagerada pelos teóricos LA, ao mesmo tempo que pouca ou nenhuma atenção é atribuída a investigação extremamente importante produzida no período entre o declínio da Escola de Chicago e o surgimento da Escola de LA, sobretudo o trabalho de teóricos marxistas como Manuel Castells, David Harvey, e Henri Lefebvre.
  2. Na mesma linha de ideias, grande parte do trabalho da Escola de LA tem sido criticada pela sua relativa incoerência e falta de metodologia comprovada. 
  3. A crítica final questiona  a afirmação fundamental da Escola de LA de que Los Angeles deve ser considerada a cidade americana pós-moderna paradigmática. Tal resulta de comparações externas entre Los Angeles e outras cidades e da conclusão de que, em certos fenómenos urbanos, a realidade de Los Angeles não corresponde à de outras cidades americanas.
 
 
Michael Dear
Michael Dear é geógrafo, com formação em planeamento regional e urbano. É professor em várias universidades dos EUA e algumas de Inglaterra.
Na sua obra mais importante, From Chicago to L.A.: Making Sense of Urban Theory, Michael Dear propõe uma agenda de investigação alternativa à sociologia urbana que se fazia em Chicago.

Mais informação aqui.
 
 


A Escola de Chicago e, em particular, Robert Park:
  • Via a cidade como um todo unificado; 
  • Via a cidade como um sistema regional coerente em que o centro organiza todo o seu território em redor (as periferias);
  • Via o centro urbano como a fonte da cultura urbana para o exterior;
  • O entendimento da condição urbana estava centrado nos indivíduos, nas suas subjetividades e nas suas escolhas;
  • O elemento estruturante do modelo de Chicago são os anéis ou as zonas concêntricas do crescimento urbano (E. Burgess).

Los Angeles põe em causa este modelo de Chicago, a partir da análise da realidade concreta, de LA. A mudança de paradigma de Chicago para Los Angeles representa uma transição da visão modernista para a visão pós-modernista da urbanização.

Segundo a perspetiva de LA:
  • Não é o centro que organiza as periferias; são as periferias que organizam o resto da cidade.
  • Há cidades, como LA, que crescem sem centro.
  • Há novas expressões de riscos ambientais nas cidades e de degradação urbana.


Bibliografia:
 
ARISTÓTELES (1966), A Política. São Paulo: HEMUS.
BAUMAN, Zygmunt (2007), Tempos Líquidos. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed.
BENEVOLO, Leonardo (1995), A cidade na história da Europa. Lisboa: Editorial Presença.
BORJA, Jordi (1997), “Las Ciudades como Actores Políticos”, América Latina Hoy, Vol. 15, 15-19.
COSTA, Eduarda Marques da (2002), “Cidades Médias. Contributos para a sua definição”, Finisterra, XXXVII, 74, 101-128.
CRUZ, Manuel Braga da (2001), Teorias Sociológicas: Os fundadores e os clássicos (antologias de textos). Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian.
ENDLICH, Ângela (2006), Pensando os papéis e significados das pequenas cidades do Noroeste do Paraná. Tese de Doutoramento em Geografia. São Paulo: Universidade Estadual Paulista.
FREITAG, Barbara (2006), Teorias da cidade. Campinas (SP): Papirus.
GIDDENS, Anthony (2000), Sociologia. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian.
GOMES, Carina (2013), Cidades e Imaginários Turísticos: Um estudo sobre quatro cidades médias da Península Ibérica. Faculdade de Economia da Universidade de Coimbra: Tese de Doutoramento em Sociologia - Cidades e Culturas Urbanas.
Hogan, Kathleen M. (2011), “Robert Owen and New Harmony”.
HORTA, Ana Paula (2007), Sociologia Urbana. Lisboa: Universidade Aberta.
MELA, Alfredo (1999), A Sociologia das Cidades. Lisboa: Estampa.
RÉMY, Jean; VOYÉ, Liliane (1994), A cidade: rumo a uma nova definição?. Porto: Afrontamento.
REPS, John W. (s/d), “Modern Sanitary Science –A City of Health”.
ROQUES, Jean-Luc (2009), La fin des petites villes: Une modernité envahissante. Paris: L’Harmattan.
Vancouver Working Group Discussion Papers for the World Urban Forum (2005), “The Impact of the Ideal City”, in The Ideal City. Vancouver: University of British Columbia.  
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HORTA, Ana Paula (2007), Sociologia Urbana. Lisboa: Universidade Aberta.
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