As Maravilhas do Mundo e as Maravilhas de Portugal

Com o projeto das 7 Maravilhas do Mundo, que tinha como objetivo declarado a revivificação do espírito das 7 Maravilhas do Mundo Antigo, parece que as maravilhas não param de surgir um pouco por toda a parte. A listagem das primeiras maravilhas, as do Mundo Antigo, é atribuída ao historiador grego Herodotus (484 a.C. – 425 d.C.) e ao chefe da Biblioteca de Alexandria, Calimachus de Cyrene, embora também se acredite que a lista original com as 7 maravilhas do mundo tenha sido elaborada por Bizâncio e constasse da sua obra Sobre as Sete Maravilhas.

Embora não exista um consenso em torno da origem da lista, a verdade é que as 7 maravilhas incluídas refletiam a capacidade dos seres humanos na transformação da natureza de forma a construírem estruturas belas que deslumbravam e inspiravam as populações. Esta lista incluía:

A Grande Pirâmide de Gizé
Os Jardins Suspensos da Babilónia
A Estátua de Zeus em Olímpia
O Colosso de Rodes
O Farol de Alexandria
O Mausoléu de Halicarnasso
O Templo de Ártemis

Face a esta lista antiga, o projeto das 7 Maravilhas consistiu na eleição das Novas 7 Maravilhas do Mundo, em 2007, mas também das Maravilhas da Idade Média, das Maravilhas da Engenharia Civil, das Maravilhas construídas pelo Homem (itálico meu), das Maravilhas da Natureza e, ainda, das Maravilhas Subaquáticas.

Fonte: www.7wonders.com
As Novas 7 Maravilhas do Mundo, cuja declaração oficial global foi realizada a partir de Lisboa, a 7 de Julho de 2007, são as seguintes:

Muralha da China, China
Petra, Jordânia
Cristo Redentor, Brasil
Machu Picchu, Peru
Chichen Itza, México
Coliseu de Roma, Itália
Taj Mahal, Índia


Ora, à boa e tradicional maneira portuguesa, talvez pela inspiração do momento em Lisboa, decidiu-se que nós, em Portugal, também deveríamos eleger as nossas próprias maravilhas. Começou-se pela eleição das 7 Maravilhas de Portugal, cuja campanha, segundo os representantes oficiais, "fez a maior divulgação de sempre do nosso património histórico e cultural, recuperou o interesse das populações pelos belíssimos castelos, palácios, igrejas e mosteiros que marcam a nossa paisagem." Daqui resultou a seguinte lista:

Mosteiro de Alcobaça
Mosteiro dos Jerónimos
Palácio da Pena
Mosteiro da Batalha
Castelo de Óbidos
Torre de Belém
Castelo de Guimarães

A estas, seguir-se-iam as 7 Maravilhas de Origem Portuguesa no Mundo, eleição agitada pela denúncia do seu cariz colonialista mas que, uma vez mais nas palavras dos seus representantes, apenas representava "o orgulho dos portugueses na sua história, no seu património além-fronteiras. Só um povo edificou 27 monumentos em 3 continentes diferentes e esse povo somos nós". A este respeito, não posso deixar de referir um contributo, em tom provocador mas inteligente, encontrado na blogosfera:

"“Mais maravilhas? Mas isso não está já a cheirar mal?”, pergunta o cidadão comum, esclarecido e de gosto refinado, enquanto limpa a cavidade nasal com o indicador e emborca mais uma imperial. Com efeito, assim é. Desde que mentes brilhantes internacionais decidiram promover a eleição das novas 7 maravilhas do mundo por voto telefónico (se tivéssemos mais uns milhões de habitantes, até lá conseguíamos enfiar o Centro Comercial Colombo), houve mentes igualmente brilhantes, mas de formação nacional, a decidir capitalizar a euforia que não chegou a existir, promovendo a eleição simultânea de outras tantas maravilhas de Portugal. O mesmo brilhantismo precisou de dois anos para engendrar nova iniciativa: as 7 maravilhas de origem portuguesa no mundo. Rebuscado? Por comparação com as 7 maravilhas de origem mundial em Portugal (que virão a seguir) é até bastante simples e evidente. Mas há algo que não está bem. Olhando a lista de 27 “maravilhas” em votação, verificamos que, das 27, 11 são igrejas, conventos, santuários, mosteiros, basílicas e catedrais, dez são fortes e fortalezas e 5 são centros históricos de cidades coloniais, acrescentando-se ainda a Ilha de Moçambique. Espera-se que isto impressione? A Ilha de Moçambique impressiona realmente e muitos desconhecerão que o poderio dos portugueses das Descobertas lhes permitia erguer ilhas sobre o oceano, mas o resto não. O que diz esta lista da presença histórica portuguesa no mundo? Diz que os nossos antepassados, que nos habituámos a ver como heróicos, faziam duas coisas: rezavam e batiam nas pessoas. Possivelmente, em simultâneo ou com uma relação de causa-efeito. Nos intervalos das rezas e da violência, refugiavam-se em recantos urbanos construídos para recordar a terrinha e com a preocupação de serem “centros”. Para periferia já bastava a pátria distante."

Naturalmente, a história não ficaria por aqui. Com a eleição da Fortaleza de Diu (Índia), a Fortaleza de Mazagão (Marrocos), a Basílica do Bom Jesus de Goa (Índia), a Cidade Velha de Santiago (Cabo Verde), a Igreja de São Paulo (Macau), o Convento de São Francisco de Assis da Penitência (Ouro Preto - Brasil), o Convento de São Francisco e a Ordem Terceira (São Salvador da Bahia - Brasil, viriam as 7 Maravilhas Naturais de Portugal.
Até os promotores deste evento já denunciavam, mesmo que disso não tivessem consciência, o exagero de maravilhas portuguesas:

"Depois do sucesso obtido com a eleição das "Novas 7 Maravilhas do Mundo®" e "7 Maravilhas de Portugal®" em 2007 e "7 Maravilhas de Origem Portuguesa no Mundo®" em 2009, foram eleitas as "7 Maravilhas Naturais de Portugal®", reveladas a 11 de Setembro de 2010, em Ponta Delgada, nos Açores."

Desta vez, venceriam as Grutas de Mira D'Aire, a Lagoa das Sete Cidades, o Portinho da Arrábida, a Paisagem Vulcânica da Ilha do Pico, o Parque Nacional da Peneda-Gêres, a Ria Formosa e a Floresta Laurissilva (Florestas e Matas).
Faltava ainda conhecer as 7 Maravilhas da Gastronomia:

"As "7 Maravilhas®" são um promotor por excelência da identidade nacional de Portugal. Após a divulgação e promoção do património histórico e natural do nosso país, o ano de 2011 foi dedicado à Gastronomia, um dos grandes valores e paixão dos portugueses."

Além do orgulho nacional na história do país e no expansionismo passado, temos agora a promoção da identidade nacional através da gastronomia. Resta dizer que, em termos de gastronomia, os vencedores foram a Alheira de Mirandela, o Queijo Serra da Estrela, o Caldo Verde, o Arroz de Marisco, a Sardinha Assada, o Leitão da Bairrada e o Pastel de Belém.
E, como se não bastasse, os portugueses vão eleger este ano as 7 Maravilhas - Praias de Portugal. Porquê? Porque...

"As 7 Maravilhas® vão continuar a promover os grandes valores da identidade nacional [...] A eleição das "7 Maravilhas - Praias de Portugal®" centra-se em três eixos estratégicos: Ambiente, Turismo e Mar. Este é um projeto que visa promover as praias nacionais, de forma a preservar a sua beleza e unicidade. A preocupação ambiental faz já parte da missão das 7 Maravilhas®, desde a eleição em 2010 das 7 Maravilhas Naturais de Portugal®."

Fala-se, então, do verdadeiro interesse por detrás destes projetos. Se para alguns poderia estar em causa apenas a promoção da identidade nacional - o que, por si só, já seria bastante discutível pelas alusões colonialistas implícitas no processo - os responsáveis por esta eleição esclarecem que, afinal, espera-se também algum retorno em termos de procura turística. Expectativa totalmente legítima, parece-me. Mas também me parece que, quando se trata da promoção turística de qualquer cidade, região ou país, os exageros são contraproducentes. E no que respeita a maravilhas, não temos só 7. Na verdade, já vamos com 28 e a caminho das 35. Talvez já seja suficiente.

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